Inter e Intrageracionalidade
Intergeracionalidade

Compreender o conceito da intergeracionalidade implica compreender o conceito de relação. Uma relação é uma conexão entre duas ou mais coisas, que podem ser objetos, pessoas, factos ou acontecimentos. O termo intergeracional significa uma convivência entre duas pessoas que se encontram em diferentes fases das suas vidas, implicando um reconhecimento e identificação de modo que entendam a plenitude e a especificidade de cada um.

Assim sendo, as relações intergeracionais podem ser entendidas como vínculos que se estabelecem entre duas ou mais pessoas distintas e em diferentes estádios de desenvolvimento. Estando em diferentes estágios de desenvolvimento, existe uma possibilidade de cruzamento de experiências e uma contribuição para uma unidade entre a multiplicidade de experiências e realidades.

Os intervenientes nestas práticas reúnem características muito próprias, o que enriquece a relação em causa e motiva a sua continuação. Por exemplo, as relações entre avós e netos são o exemplo perfeito, sendo das práticas mais antigas ao longo das várias civilizações na História, e permanecem até aos dias de hoje como as chaves lógicas para a sustentação de muitas comunidades. 

Encaradas como modelos de exercício de cidadania, as relações entre gerações têm vindo a dar provas da sua relevância. Demonstram cada vez mais que o grau de influência que exercem diretamente sobre os dois grupos que estabelecem a relação compromete direta e indiretamente todas as pessoas da comunidade ou sociedade em questão.  

A aproximação de diferentes gerações tem em conta não só o fator cronológico como também os estilos de vida diferentes, os valores, a memória, entre outros aspetos. Nesta conexão e transmissão de saberes não linear, ambas as gerações possuem sabedorias distintas e possibilita uma nova história em comum, a partir da experiência de cada um, e funcionando como via dupla. (não percebo bem esta frase, depois de sabedorias distintas.) 

É a isto que nos propomos com o projeto Eco-IPSS - Gerações Circulares, na medida em que, através da dimensão intergeracional dos vários utentes das IPSS, a troca de valores e aprendizagens, a partilha de mundividências, permite a todos aprender e ensinar. 

as relações entre avós e netos são das práticas mais antigas e permanecem até aos dias de hoje como as chaves lógicas para a sustentação de muitas comunidades

A forma como cada grupo, dentro da IPSS, se entrega através da partilha, envolve um crescimento social e emocional dos vários intervenientes, provocando impacto no desenvolvimento de todos. 

Há teóricos que defendem que esta aprendizagem intergeracional se tem vindo a perder no seio das famílias, devido a muitos fatores, entre eles o geográfico. A infância e a velhice já não convivem tanto como antigamente, devido também à enorme mobilidade das gerações atuais. A maternidade e paternidade vêm mais tarde, o que também dificulta esta convivência. Fomentá-lo em sede das IPSS, mesmo fora do contexto estritamente familiar é, portanto, uma oportunidade a valorizar. 

Hoje sabemos que as oportunidades para aprender entre gerações podem ter lugar numa variedade de contextos sociais e através de diferentes programas e projetos. Desta forma passa a haver uma assistência ao capital social e à criação de ligações e coesão social nas nossas comunidades.

a coesão social e a intergeracionalidade, facilitadas por “atividades circulares”, têm um contributo importante na transição para sociedades mais sustentáveis

Também funciona muito bem de forma a combater os estereótipos que existem e a discriminação contra as pessoas baseada na sua idade, que acontece tanto em relação a pessoas mais velhas como mais novas. Esta coexistência, convivência e apoio mútuo intergeracional pode ajudar a resolver as alterações demográficas e trazer solidariedade ao ciclo da vida, derrubando barreiras e trazendo humanidade. 

A estereotipação negativa e a falta de contacto entre estes grupos levou e pode levar a que haja uma deterioração na coesão social das nossas comunidades. Ambos os grupos têm recursos que são valiosos. Através da aprendizagem intergeracional podem partilhar as suas competências e valores uns com os outros. Ambos os grupos são marginalizados nas tomadas de decisão..  

Com a atual pandemia da covid-19 as relações intergeracionais são mais importantes do que nunca. Estamos a presenciar uma nova subida nas manchetes negativas dos meios de comunicação. Numa base regular assistimos ao recurso a títulos assustadores que fomentam estes estereótipos entre as gerações. Um programa de rádio intitulou inclusivamente uma rubrica de conversa “Será que os jovens estão a matar as pessoas mais velhas?” 

Esta forma dos média contarem a história das nossas sociedades e comunidades está a distanciar as gerações até em tempos em que nos devíamos estar a apoiar e ajudar cada vez mais uns aos outros. 

Programas intergeracionais são muito mais do que “atividades de bem-estar”. Beneficiam mutuamente os seus participantes bem como os voluntários, o staff, os membros da família, as organizações e a comunidade. Podem ajudar a construir comunidades mais ativas e seguras, reduzir a desigualdade, reduzir o isolamento social e a solidão, apoiar na construção de relações em comunidades, melhorar a saúde mental e o bem-estar, aumentar a conexão digital e contribuir para a melhoria dos muitos desafios que as alterações climáticas nos trazem. 

Assim, a coesão social e a intergeracionalidade, facilitadas por “atividades circulares”, têm um contributo importante na transição para sociedades mais  sustentáveis. As IPSS, na medida em que permitem que esta intergeracionalidade dê origem a uma coesão social, constituem o contexto e os condicionalismos perfeitos para fomentar a circularidade. 

É uma dupla circularidade na verdade: da economia e do seu fruto mais evidente, a produção e os serviços; e uma circularidade na aprendizagem, entre os mais velhos e os mais novos.  Todos aprendem uns com os outros, sobre as inúmeras dimensões da vida em sociedade e as questões ambientais, sob diferentes perspectivas, podem ser encaradas de forma mais aberta e até simplificada.

Principalmente agora em contexto de situação pandémica, Portugal enfrenta uma crise demográfica com um acentuado envelhecimento da população. Embora este facto deva ser contrariado por diversas razões, as sociedades modernas devem investir no envelhecimento ativo, na participação e nas relações sociais intergeracionais, beneficiando de melhorias na qualidade de vida, da independência e do bem-estar individual e colectivo. 

Precisamos de uma nova forma de focarmos as nossas comunidades no paradigma intergeracional, que dá origem a novos propósitos e possibilidades, para alcançar uma sociedade mais humana, mais centrada nas pessoas onde há mais atenção e preocupação com os seres humanos e com o planeta que estes habitam.